Mesclado às várias
crenças religiosas brasileiras, o paganismo – seja politeísta, naturalista ou
animista - tem ganhado espaço e novos adeptos, confrontando uma realidade
majoritariamente cristã e monoteísta. Pelo viés histórico-antropológico, é
perceptível que essas culturas pagãs são “resgatadas” de hierofanias já
decadentes ou extintas, transpondo elementos desses sistemas de crenças,
práticas e valores à contemporaneidade. Esse processo de apropriação engendra
novas crenças, práticas e valores, mediante a ressignificação e a recepção
ativa de sistemas já declinados, criando-se dessa forma novos sistemas
religiosos. Historicamente, esse processo poderia ser considerado de certa
forma anacrônico, pois se extraem de uma cultura traços, símbolos e mitos, os
quais, transportados para uma cultura temporal e espacialmente diferente,
permitem a criação ou invenção de correspondências entre a cultura doadora e a
receptora. Entretanto, culturalmente e antropologicamente, a partir do momento
em que esses traços são aceitos e incorporados em uma nova cultura, estes
passam a fazer parte integrante dela, portanto, passam a ser pertencentes
àquele novo sistema religioso.
Esse processo cultural pode ser percebido, hoje, pelos
praticantes da bruxaria moderna, denominada de Wicca. Essa crença aceita uma
grande quantidade distinta de panteões de deuses e deusas de antigas crenças
extintas, principalmente celtas. Os praticantes dessa religiosidade afirmam ser
esta umaprática pré-cristã, por
isso a denominam de “Antiga Religião”. Historicamente, sabemos ser impossível
que estas crenças antigas e cultos camponeses relacionados principalmente à
colheita, tenham se mantidos intactos após a Inquisição; portando, o que é hoje
chamado wicca é uma reinterpretação dos vestígios de cultos antigos, já
mesclados e com influências cristãs e
modificados pelo processo inquisitorial, o que não torna esta uma prática
irrelevante para percebermos traços de nossa cultura atual.
Com um método focado na
história oral, na história das religiões e das religiões comparadas, buscamos
entender esses pequenos traços culturais atuais/atualizados, mediante os quais
seus adeptos buscam no passado respostas para o presente, em uma espécie (em
uma escala menor, é claro) de renascimento politeísta, questionando assim o
sistema evolucionista “darwiniano” animismo-politeísmo-monoteísmo,
reintroduzindo no campo religioso crenças já extintas e muitas vezes consideradas
primitivas.Outro aspecto
importante da pesquisa diz respeito aos veículos que permitem essa
transposição, os meios pelos quais se tornam públicos os conhecimentos desses
cultos antigos e como estes legitimam e naturalizam essas extintas hierofanias
em novos sistemas culturais-religiosos que passam a novamente a serem aceitos e
suprir necessidades religiosas atuais de um segmento crescente de pessoas. Como
essas antigas crenças têm penetrado e incorporado nosso sistema cultural? Como
opera esse modo de recepção? E porque elas têm ganhado tanto espaço na
sociedade contemporânea? Tais são as questões que movem esta pesquisa
histórico-antropológica.
Trabalho completo disponível pelo link:
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